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Numa indústria ainda a carburar, segundo semestre é rol de incertezas

As exportações de Guimarães aumentaram 20% nos cinco primeiros meses de 2022, mas a par dos custos, energéticos sobretudo. Se a tendência se mantiver, os ganhos podem-se esfumar no segundo semestre.

27 julho 2022 > 09:00

Se em 2021, Guimarães reatou a trajetória ascendente nas exportações, em 2022 parece cimentar essa rota como se o mundo estivesse igual: depois do crescimento de 23% entre 2020 e 2021, os cinco primeiros meses deste ano traduzem uma subida de 20% face a período homólogo. Segundo contas do Jornal de Guimarães a partir dos dados provisórios do Instituto Nacional de Estatística (INE), o município arrecadou 740,6 milhões entre janeiro e maio de 2022; em 2021, ficara-se pelos 618 milhões de euros.

A indústria têxtil e de vestuário bateu, em 2021, o seu recorde de exportações (5,42 milhões de euros). Guimarães, o seu território mais exportador, com 965 milhões em vendas no ano passado, continua a crescer: os 382,5 milhões de janeiro a maio de 2021 transformaram-se numa receita de 431,6 milhões nos cinco primeiros meses de 2022.

Os resultados dão-se, porém, num cenário de guerra na Ucrânia e de inflação, com reflexos nos custos de transportes de mercadorias e, mais recentemente, energéticos, sobretudo no gás. Grupo com operações em Moreira de Cónego, Vilarinho (Santo Tirso) e Vizela, a Polopiqué vinca que os aumentos na eletricidade e no gás natural, matéria-prima com “especial relevância para tinturarias e acabamentos têxteis”, estão a revelar-se “insustentáveis”.

Apesar dos prometidos “apoios estatais”, o grupo com mais de 860 trabalhadores vê o volume de vendas aumentar graças ao aumento dos preços. “O volume de vendas aumenta, mas não necessariamente pelo aumento da procura”, reconhece fonte ligada à administração do grupo têxtil que, em 2021, se aproximou dos 90 milhões de euros em volume de negócios.

O presidente da Associação Têxtil e Vestuário de Portugal, Mário Jorge Machado, realça que não tem sido possível passar “todo o aumento dos custos de produção” – entre a 30 a 40% desde o início do ano – para os clientes e lamenta a “pequena ajuda” do Governo e da Comissão Europeia perante a dimensão do problema.

Elogioso para com a aposta lusa na “sustentabilidade e na circularidade”, diferenciadoras perante concorrentes como a Turquia, o dirigente reconhece que as empresas a trabalhar para os Estados Unidos têm “alguma vantagem” face às que trabalham para a Europa, mais permeável a impactos da guerra. A “incerteza” é muita, acrescenta. “Se não tivéssemos uma guerra, poderia ser um excelente ano nas exportações. Com o que temos pela frente, corremos o sério risco de que tudo o que conseguimos ganhar nestes primeiros meses possa ser destruído no segundo”.

 

Calçado sente procura renovada pela Europa

Também a Celita, fabricante de calçado, atesta uma maior procura no início de 2022, apesar dos “aumentos significativos” dos custos para a indústria. “Apesar do contexto desfavorável, temos verificado uma deslocação da produção dos países asiáticos para a Europa e, claro, Portugal”, adiantou Miguel Amaral Vieira, diretor de marketing da empresa detentora da marca Ambitious.

De janeiro até maio de 2022, o crescimento homólogo das exportações do calçado face a 2021 supera francamente o da globalidade do tecido económico vimaranense: é de 46%, rumo aos 96 milhões de euros. Com um volume de negócios que, em 2021, ascendeu aos 16 milhões de euros, a Celita é uma das empresas do ramo capazes de “exportar a quase totalidade da produção”, mas o responsável avisa que “as matérias-primas estão mais escassas e com enorme volatilidade de preço”.

Convencido de que a Ambitious, marca presente em mais de 50 países, pode entrar em “novos mercados”, Miguel Amaral Vieira salienta que o crescimento futuro depende da “capacidade de gestão e de adaptação” da Celita; com cerca de 200 trabalhadores, a empresa de São Torcato tem contornado o aumento dos custos energéticos com a “otimização de processos internos” e “investimento em maquinaria”, mas o prolongamento de uma conjuntura de aumento de custos pode dificultar operações futuras.

“Neste momento existem atrasos nas entregas que nos condicionam o calendário de produção. A previsão desta situação a longo prazo exigirá um planeamento rigoroso para assegurarmos o normal funcionamento da Celita”, antecipa o diretor de marketing da empresa.

 

Se a tendência de custos se mantiver, “competitividade” vai-se perder

A tendência de crescimento nos cinco primeiros meses de 2022 alastrou-se ao setor metalúrgico: o volume de exportações cresceu 52,8%, dos 49,64 para os 75,87 milhões de euros. A maior empresa do ramo a operar em Guimarães, a Amtrol-Alfa, exporta 95% da sua produção e está a “aumentar o volume de vendas”, apesar de forçada a “reduzir as margens”.

“Temos passado os custos do aumento para os clientes. Alguns aceitam, outros não. Este aumento de custos é significativo e tem-nos obrigado a reduzir as margens”, adianta ao Jornal de Guimarães o diretor-geral, Tiago Oliveira, antes de esclarecer que o preço das matérias-primas “aumentou brutalmente” desde o início do ano.

Líder mundial na produção de garrafas de gás em aço, com 800 trabalhadores e um volume de negócios que, no ano fiscal anterior, chegou aos 130 milhões de euros, a Amtrol-Alfa até se “adaptou mais rapidamente do que a concorrência a um novo ambiente internacional de matérias-primas e de mercado”, mas pode perder essa vantagem caso a tendência de custos se prolongue. “Se os custos se mantiverem, nomeadamente na energia, vamos começar a perder competitividade”, detalha o responsável.

A empresa instalada em Brito pertence ao grupo norte-americano Worthington desde 2017, circunstância que lhe dá mais margem para “negociar com os fornecedores”, e tem como principais concorrentes empresas de países asiáticos, para produtos de baixo valor acrescentado, e do Norte da Europa, para alto valor acrescentado. A LPG Week, principal feira do setor, vai decorrer entre 14 e 18 de novembro, na Índia, palco que não é o “ideal”, precisamente pela concorrência. Mas a Amtrol-Alfa vai lá estar. ”A feira realiza-se num país diferente a cada ano. A Índia é o maior produtor e consumidor de garrafas. Não é o que queremos, mas somos os líderes mundiais e temos de estar presentes em todas as feiras”, reitera.

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