Senhora da Oliveira quer ser hospital universitário: com investigação reconhecida, há espaço para um cluster
Pedro Cunha é o diretor do Centro Académico e de Formação da unidade de saúde e aponta como objetivo chegar aos “patamares em que estão os melhores da Europa”. O caminho para lá chegar está traçado.

Por entre os corredores mais recônditos do Hospital Senhora da Oliveira – Guimarães (HSOG), entre consultórios e salas, distante da azáfama das ambulâncias e do soar dos alarmes, produz-se conhecimento. Conhecimento científico de excelência, “do que melhor se faz no país”, vincou Henrique Capelas, presidente do conselho de administração do HSOG, na cerimónia em que Pedro Cunha trocou a normal bata de médico pelo fato. Nessa cerimónia, a 26 de maio, o Centro Académico e de Formação (CAF) daquela unidade de saúde foi certificado oficialmente pela Norma Portuguesa 4457, que atesta a competência do HSOG como entidade com sistema eficaz de Gestão da Investigação, Desenvolvimento e Inovação (IDI).
Pedro Cunha é o diretor do CAF e um dos principais entusiastas do trabalho aí desenvolvido; coordena uma equipa com mais de duas centenas de investigadores que, nos últimos quatro anos, trabalhou na sombra, implementando as suas normas de trabalho. Em três anos, os ensaios clínicos triplicaram e, em 2021, passaram pelo hospital mais de 900 alunos de várias instituições de ensino superior, tendo-se realizado mais de 500 estágios profissionais. A certificação do CAF dá à investigação do HSOG um cunho único no país, uma vez que é o único equipamento do Serviço Nacional de Saúde (SNS) com a totalidade da norma certificada.
“Somos um exemplo de trabalho, sem dúvida, a nível nacional. Não fomos nós que o dissemos, foram as instituições nacionais”, sustenta Pedro Cunha, assumindo, ainda que de forma cautelosa, que o reconhecimento é apenas um primeiro passo de uma ambição maior na estrutura do CAF, como veremos mais à frente. Em conversa com o Jornal de Guimarães, o médico natural do Porto, há vários anos radicado em Guimarães, enumera as vertentes nas quais o hospital se certificou: “Fomos o primeiro Centro do país a certificar-se na parte de investigação, na parte do desenvolvimento de ideias e também na vertente de capacitação, isto é, formação e ensino”.
Esta capacidade do HSOG já era notada entre o meio clínico, com “vários promotores a voltarem ao Centro e a trazerem mais ensaios”, sendo agora reconhecido com a Norma Portuguesa 4457 e com a certificação da AICIB (Agência de Investigação Clínica e Inovação Biomédica). “Temos estes documentos de entidades externas, que são importantíssimos, porque atestam a nossa qualidade de trabalho”, frisa o médico, convencido de que as distinções dão novo impulso à investigação do CAF. “Há um reconhecimento a nível nacional e também internacional da nossa capacidade e competência, ainda que em menor escala. Mas estamos a atrair cada vez mais promotores nacionais e internacionais. Inclusive temos alguns ensaios em que somos top recruiters da Europa”, atira.
“Ainda temos muito a trabalhar para atingir patamares onde estão os melhores centros da Europa; mas o nosso objetivo é esse”, Pedro Cunha, diretor do Centro Académico e de Formação do Hospital de Guimarães
Estes dois selos de qualidade alimentam a expansão preconizada pelo CAF do Senhora da Oliveira, há muito ambicionada e planeada e agora munida de alicerces para escalar mais uns degraus na ambição em chegar ao topo. “Passamos a ter mais divulgação daquilo que fazemos”, destaca, enaltecendo a visão do conselho de administração, liderado por Henrique Capelas, de colocar o hospital ao nível dos principais centros europeus.
“Ainda temos muito que trabalhar e progredir para alcançar os patamares dos melhores centros da Europa. Mas o nosso objetivo é esse. Estamos na fase de dizer o que temos e as três linhas em que queremos avançar: como hospital universitário; como elemento ativo num cluster de saúde e num hub de Investigação; e como Hospital de Dia de Investigação Clínica”, dá conta, de forma sistematizada e completamente focada, Pedro Cunha.
O Hospital de Dia de Investigação Clínica, infraestrutura a implementar de raiz no HSOG, deverá estar em funcionamento até ao final do ano e “permite dar o salto para outro patamar”, perspetiva Pedro Cunha. Os ensaios clínicos em curso, dispersos pelos vários serviços onde os pacientes se encontram, serão agregados nesta nova valência, que pode congregar todos os protocolos numa só equipa, fazendo o CAF “ganhar qualidade”. Isto será possível porque o HSOG passará a ter “uma área dedicada com camas monitorizadas”. “É outro patamar no domínio da nossa capacidade contribuir para a geração de conhecimento”, aponta o especialista em Medicina Interna.
Hospital universitário: sobram reconhecimentos, falta o carimbo do Ministério
Outra das aspirações, já reclamada publicamente, é a intenção de ser um hospital universitário. A unidade de saúde trabalha de forma articulada com a Universidade do Minho há quase duas décadas, ajudando a formar médicos, enfermeiros, psicólogos, técnicos de diagnóstico, entre outros profissionais de saúde, o que leva Pedro Cunha a afirmar que o HSOG é “uma verdadeira escola”. “Somos um hospital universitário e precisamos desse reconhecimento. Não estamos a pedir nada diferente para nós que não seja já reconhecido a outros”, pontua.
Falta a formalidade necessária - o carimbo - para que o Senhora da Oliveira passe a ser hospital universitário e, com isso, abra novos horizontes à investigação. “Há uma estrutura que pode ser criada no âmbito de um hospital universitário na questão do financiamento”, admite o diretor, apontando também as portas que se abrem ao nível de “parcerias de formação”. “Permite agregar outros profissionais, não só da área da saúde, mas da área da investigação, o que permite construir pontes importantes”. E há ainda a ter em conta o reconhecimento da tutela. A solicitação para tornar o HSOG universitário já foi submetida ao Ministério da Ciência e do Ensino Superior, algo que “irá seguramente acontecer”, crê Pedro Cunha.
O terceiro pilar desse crescimento surgiu em jeito de desafio pelo presidente da Câmara Municipal de Guimarães; na cerimónia de certificação do CAF, Domingos Bragança mostrou-se aberto à criação de um cluster de investigação clínica, com um hub de inovação. É uma ideia ainda em fase embrionária, mas que Pedro Cunha pretende abraçar. “Vamos agarrar a proposta do presidente da câmara de pedra e cal, porque um cluster de saúde com um hub de investigação é fundamental. Não vamos largar essa possibilidade e acreditamos que vai acontecer, porque a cidade tem apostado, de há uns anos para cá, em tornar-se um centro de conhecimento, atraindo cada vez mais universidades, escolas, institutos e parques tecnológicos”, relata Pedro Cunha com entusiasmo.
O caminho está traçado e o HSOG demonstra vontade de o trilhar, sendo parte ativa no melhoramento da investigação que se pratica no país. “Oferecer aos profissionais a possibilidade de fazer uma carreira académica, desenvolvendo o seu conhecimento” é algo por que Pedro Cunha se bate. Até porque muito do trabalho desenvolvido sai do esforço e da resiliência de todos. Para lá da investigação, os médicos continuam a ser médicos e a bata continua a ser farda.